terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O gênero tira enquanto recepção/compreensão leitora nas atividades do livro didático

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Por Germano Xavier e Emerson Rezende



O GÊNERO TIRA ENQUANTO RECEPÇÃO/COMPREENSÃO LEITORA NAS ATIVIDADES DO LIVRO DIDÁTICO

Objeto: Livro didático: Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM.

Objetivo: Verificar se os textos do gênero tira, propostos no livro didático Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM, cumprem a função de recepção/compreensão leitora do respectivo gênero com as propostas teórico-metodológicas dos estudos retóricos e sociológicos de gênero, principalmente no que tange a fatores relacionados ao propósito comunicativo.

Metodologia: De início, selecionamos gêneros tira a fim de ser analisada a função leitora nesse estudo. Em seguida, verificamos quais são os gêneros tira presentes no livro em questão e os quantificamos. Para as atividades propostas com o referido gênero, examinamos se essas atividades trabalham as abordagens dos estudos retóricos e sociológicos de gêneros e como isso ocorre. Por fim, observamos as questões de especificidade do gênero tira presentes na obra.

Critérios: Avaliamos a presença dos aspectos teóricos no gênero tira, se condizem ou não com as referidas perspectivas teóricas abordadas. Os critérios a serem utilizados no prezado estudo consideraram as terminologias utilizadas, assim como os conceitos que podem ser depreendidos delas. Inicialmente selecionamos gêneros tira a fim de ser analisada a função leitora nesse estudo.

É de se saber que o gênero tira, nos livros didáticos de língua portuguesa, utiliza-se não apenas de referenciais de natureza particular ao próprio gênero para se associar a objetivos não específicos, mas também de meios outros e diversos que, por tradição, sempre estiveram atrelados a tais objetos, a citar a sua ênfase na recepção/compreensão leitora.

Atualmente, diante da vasta esfera do saber linguístico, facilmente percebemos, no tocante aos estudos mais profundos e analíticos dos gêneros textuais, que a noção que se tem do elemento propósito comunicativo abarca uma quantidade considerável de visões acerca das práticas de um dado gênero.

Nos Estudos Retóricos de Gênero (ERG), uma das bases deste nosso olhar, o motor de concentração mais relevante condiz com a forma como os gêneros aperfeiçoam e otimizam nos usuários da língua ações com desenvolturas com ordenamentos sociais.

Neste complexo de ideias, o contexto é um eixo de desempenhos gerido pelos gêneros e por tantas outras ferramentas existentes nas esferas culturais. Moldam-se, portanto, realidades sociais a partir de situações de ação social envolvendo os gêneros, de modo que tudo parece se dar dentro das fronteiras do contexto.

Ao que nos toca a observação da presença e da potencial performance de usufruto do gênero tira no livro didático de Língua Portuguesa em questão, Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM, tendo como base os estudos de gênero compreendidos e esmiuçados em ambiente acadêmico, conferimos, de maneira clara, que a expressão basal atrelada à tira, ligada à recepção/compreensão, assume um caráter de subpotencialidade, não desempenhando o papel que poderia ser empreendido naturalmente.

Observando a flexibilidade com que o propósito comunicativo rompe a “ordem natural das coisas”, é que Biasi-Rodrigues e Bezerra (2012) tentam esclarecer posicionamentos diretivos no interior de tal escaramuça conceitual, na busca por arquitetar uma estrutura de conhecimentos sobre o senso/status do gênero ao fim das investigações, não deixando o interesse para com o estudo do propósito comunicativo como sendo um requisito nato em prol do saber de gêneros. E com o gênero tira, por conseguinte, não ocorre diferente.

Ainda tomando como ponto de apoio os estudos em ERG, percebe-se que o pensamento de que gênero está imiscuído em um sistema de forte laço psicossocial, demasiadamente defendido por Bazerman, insere-o numa esfera de maior amplidão quando posto de lado de visões outras, a citar as observadas em ESP.

Aqui, não sendo apenas formas, os gêneros beiram as individualidades humanas, obtendo assim uma participação social de profundo valor para os debates instaurados. Daí a permanente ideia de que o gênero é melhor definido se aferido a partir de suas funcionalidades sociais e não com base apenas em sua estruturação formal.

Em um prisma de base escolar, assim posto, percebe-se que os gêneros se coadunam num bloco referencial bastante palpável no que tange às vistas do alunado, já que autorizam estabilizações de elementos e dadas práticas. Em assim sendo, os gêneros terminam por unidades reais sobre as quais devem girar grande parcela dos movimentos de ensino da língua.

Marcuschi (2008, p.155) diz

O gênero textual refere os textos materializados em situações comunicativas recorrentes. Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária que apresentam padrões sóciocomunicativa característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.

Diante de tais circunstâncias de maneabilidade frente ao uso dos mais diferentes tipos de gêneros em ambiente escolar para fins educacionais, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) apregoam que as aulas de Língua Portuguesa precisam estar direcionadas a um maior e mais eficaz detalhamento acerca de alguns gêneros discursivos.

E é justamente esta visão esmiuçada e mais eficiente que irá fazer com que o alunado adentre tal campo de estudo em condições mais apropriadas para o desenvolvimento de competências relacionadas à prática leitora e de escrita. E aqui entramos na questão das tiras no livro didático.

Segundo Marcuschi apud Dionísio (2005, p. 198)

As tiras fechadas dividem-se em dois subtipos: a)Tiras – piada, em que o humor é obtido por meio das estratégias discursivas utilizadas nas piadas de um modo geral, como a possibilidade de dupla interpretação, sendo selecionada pelo autor a menos provável; b)Tiras – episódio, nas quais o humor é baseado especificamente no desenvolvimento da temática numa determinada situação, de modo a realçar as características das personagens.

Todavia, para que entremos nas demandas dos estudos envolvendo os estudos de gênero, faz-se importante visualizar que todo o processo discursivo inerente ao que o gênero abordado (tira) se propõe está situado entre o objeto e a ação de um enunciador/locutor e um contexto variável de produção, recepção e compreensão discursiva.

Partindo do pressuposto de que o foco deste trabalho foi justamente o de analisar textos no gênero tira do livro didático Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM, na perspectiva da teoria de gêneros, baseando-se para isso nos primeiros olhares de Marcuschi, com apurações dos estudos sociorretóricos de gênero, o objetivo formulado e postulado seria o de verificar se os textos presentes na edição e que se inscrevem no gênero tira, propostos no livro didático supracitado cumprem a função de recepção/compreensão leitora do gênero com as propostas teórico-metodológicas dos estudos retóricos e sociológicos de gênero.

Assim sendo, Marcuschi apud Dionísio (2002, p.41.), reforça que

O gênero é fundamental na escola. É ele que é utilizado como meio de articulação entre práticas sociais e os objetos escolares, mais particularmente, no domínio do ensino da produção de textos orais e escritos. No afã de favorecer a aprendizagem da escrita de textos, a escola restringe seus ensinamentos aos aspectos estruturais ou formais dos textos. É justamente essa desconsideração de aspectos comunicativos e interacionais que contribui para que os alunos e professores se preocupem mais com a forma do texto do que com sua função e, consequentemente, o texto seja visto como formulário preenchido (para leitura) ou a preencher (para escrita).

Por força de organização metodológica, inicialmente foram selecionados exemplares do gênero tira a fim de ser analisada se a sua função leitora é prescrita de maneira clara na maior parte do panorama abordado. Assim sendo, em seguida verificamos quais são os gêneros tira presentes no livro e os quantificamos. De acordo com Kleiman (2000, p.92), “processar um texto é perceber o exterior, as diferenças individuais superficiais, perceber a intenção, ou seja, atribuir uma intenção ao autor é chegar ao íntimo, à personalidade através da interação”.

Para as atividades propostas com o referido gênero, examinamos se essas atividades trabalham com alguma das abordagens dos estudos retóricos de gêneros e como isso ocorreu. Por fim, observamos as questões de especificidade do gênero tira presentes na obra e as informações coletadas fizeram parte deste relatório, a ser apresentado em formato de seminário.

Quanto aos critérios a serem utilizados no presente estudo, avaliamos a presença dos aspectos teóricos no gênero tira, e se condizem ou não com a(s) referida(s) teoria(s) envolvida(s).

Em assim se mostrando, o gênero

É um instrumento semiótico constituído de signos organizados de maneira regular; este instrumento é complexo e compreende níveis diferentes; é por isso que o chamamos por vezes de „mega instrumentos‟, para dizer que se trata de um conjunto articulado de instrumentos à moda de uma usina; mas, fundamentalmente, trata-se de um instrumento que permite realizar uma ação numa situação particular. E aprender a falar é apropriar-se de instrumentos para falar em situações discursivas diversas, isto é, apropriar-se de gêneros. DOLZ & SCHNEUWLY (1994) apud MARCUSCHI (2008, p.212)

Em ERG, gêneros são entendidos como elaborações conceituais sociológicas. O gênero é o formador, no sentido de molde, de lugares sociais que são utilizados para se atingir outros lugares sociais comuns, mas ainda não explorados por uma respectiva base de coletividade.

Assim sendo, num total de 37 recorrências, em comparação diretiva aos objetivos das atividades onde as tiras do livro Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM foram encontradas, percebemos a distinção de uso que segue abaixo:




• 13 tiras foram encontradas na seção intitulada de REFLEXÃO LINGUÍSTICA, que pretende introduzir a reflexão critica sobre um conceito gramatical, como base em situações de uso da língua;

• 5 tiras foram encontradas na seção intitulada de ATIVIDADES GLOBAIS, que apresenta exercícios de gramática que retomam conceitos trabalhados;

• 11 tiras foram encontradas na seção intitulada de QUESTÕES DE ESCRITA, que aborda questões de ortografia, acentuação e pontuação, propondo atividades de sistematização;

• 5 tiras foram encontradas na seção intitulada de NA PRÁTICA, que propõe atividades de sistematização de conceitos linguísticos apoiadas em gêneros textuais variados;

• 3 tiras foram encontradas na seção intituladas de LÍNGUA VIVA, que amplia, em contexto discursivo, a reflexão sobre os conceitos estudados no capítulo.

O gráfico abaixo, com dados em porcentagem, representa o resultado quantitativo da investigação que teve por base a recorrência do gênero tira no livro didático Português (7º ano do Ensino Fundamental II) da coleção PARA VIVER JUNTOS, da editora SM:




Num panorama mais geral, as atividades com o gênero textual tirinha tornaram-se interessantes e importantes porque são uma forma concreta de uso da leitura/escrita como função social, que permite a ampliação das competências linguísticas e discursivas dos alunos.

Todavia, infelizmente, ainda existem professores nas escolas brasileiras que adotam os princípios pautados pela educação tradicional – quase sempre de natureza repressora e intolerante -, impondo aos alunos a leitura somente na primeira instância, a da decodificação e da memorização de normas gramaticais, limitando-se aos textos e conteúdos inseridos nos livros didáticos que mascaram a realidade do aluno. Um mais apurado e consciente uso de tirinhas em salas de aulas de língua portuguesa, portanto, faz-se imprescindível para o avanço no tocante aos processos de ensino e aprendizagem em questão.


REFERÊNCIAS

BAWARSHI, A.; REIFF, M. J. Gênero: história, teoria, pesquisa, ensino. São Paulo: Parábola, 2013. 285p.

BIASI-RODRIGUES, BERNADETE; BEZERRA, Benedito Gomes. Propósito comunicativo em análise de gênero. Linguagem em (dis)curso, Tubarão, SC, V.12, n.1, p.231-249, jan/abr. 2012.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.

DIONÍSIO, Angela Paiva (org.). Gêneros textuais e ensino. 4.ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.
KLEIMAN, Ângela. O que é leitura?. 8ª edição. São Paulo, 2004.

MARCUSCHI, Luís Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Trad. e org. Roxane Rojo; Sale Glaís Cordeiro, (org.) Gêneros orais e escrito na escola. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2004.

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