domingo, 18 de janeiro de 2015

Pelo sol da tarde

*
Por Germano Xavier

poema de fato acontecido


vinha meio perdido pelo sol das três da tarde
rompendo quilômetros abertos e nunca findáveis
entrava em cidadezinhas estranhas
de onde eu saía ainda mais estranho
seguia a rota do mapa rodoviário que havia comprado
numa outra cidade onde parei para dormir

(percebi que mapas rodoviários também falham)

embriagado pelo sol da hora
pisei forte o acelerador

fui bater em praças alheias
boa tarde, como faço para chegar aqui neste ponto...?

um homem respondeu que era só eu seguir adiante
que eu já estava na porta de saída e que logo estaria lá

quando fui soltando a embreagem
uma senhorazinha que se encontrava ao lado do moço
que havia acabado de me dar a dica de roteiro disse
você pode me levar até a entrada da Ingazeira?

eu olhei a senhorazinha
sua caixinha de papelão no canto dos pés
e disse entre
e disse vamos

o homem ajudou na acomodação da senhorinha
talvez fosse filho dela
fechou a porta traseira

certifiquei-me do cinto de segurança nela
fiz o carro se movimentar
ela disse que era pertinho dali o lugar onde ia descer
que me avisaria quando estivesse próximo

caminho pela metade

a gente tem mesmo que indagar quando fica perdido
não é?
na frente você indaga mais
que a vida é assim

fico aqui

nem bem desceu do carro
foi tirando uma notinha para me pagar
eu disse não carece

ela me benzeu com umas mãozinhas
pegou sua caixinha de papelão
e com o rosto pintado pelo sol da tarde
(vi pelo retrovisor)

rumou para lá


* Imagem retirada do site Deviantart.

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