terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Expediente de assombros


Por Germano Xavier

É incrível como alguns escritores do passado – nem tão tardio assim - desenvolveram amplamente a capacidade de nos surpreender no último parágrafo de seus textos, ou até mesmo na derradeira frase. Robert Barr é um exemplo claro de um tipo de escritor que domina todos os meandros do suspense no interior estético de um texto literário. O escritor anglo-canadense, nascido em 1850, do mesmo modo como faziam Edgar Allan Poe e Sir Arthur Conan Doyle, entre outros inumeráveis nomes, tecia uma teia pegajosa de sucessivos eventos no intuito de prender a atenção do leitor, de não o deixar que respire, para no final impor uma reviravolta tamanha que, em certos casos, poderia chegar até a dimensão do susto propriamente dito. A diferença maior está nas características temáticas trabalhadas pelos autores citados. Enquanto a maioria discursava sobre acontecimentos fantásticos e surreais, Barr se utilizava de fatos por demais próximos ao contexto comum de todos os seres sociais humanos. No conto “Um divórcio nos Alpes”, Barr narra a tentativa frustrada do personagem John Bodman de se livrar de sua esposa, com a qual mantém uma relação de ódio avassalador. Levado por seus instintos mais primitivos e obscuros, Bodman inventa uma viagem às montanhas suíças já no desígnio de exercer sua crueldade. A mulher dele aceita lhe fazer companhia e os dois viajam. O lugar é velho conhecido de Bodman, “lugar perfeito”, segundo ele, para a prática de um assassinato. A estratégia seria a de fazer com que sua esposa o seguisse até o Mirante Suspenso, nome do lugar onde tudo se daria, e lá jogá-la ribanceira abaixo. Durante a caminhada até o possível local do crime, os dois não se falam, porém travam uma verdadeira guerra inconsciente em suas mentes, como se pudessem decifrar os pensamentos um do outro. Lá chegando, Bodman, que estava esperando o melhor momento para empurrá-la de uma só vez, vê-se aterrorizado pela atitude de sua esposa. Ela rasga sua própria roupa e, de súbito, atira-se para a morte, deixando atônito o homem que planejava sua morte. Um turbilhão de idéias perturbadoras atingem a mente de Bodman, que se estupefaz de chofre. É como se Bodman tivesse sido atingido por uma espécie de morte também, e talvez a mais fina de todas: da consciência. Vivo, ele estava, a partir daquele momento, em morte contínua. Robert Barr, com sua pena maravilhosamente intrigante, demonstrou mais uma vez a importância de um clímax ou ponto de desfecho bem elaborado, aspecto em declínio quando tomamos por análise nossa atual produção literária. Talvez este seja um ponto decisivo para a manutenção do atemporal sucesso que vários clássicos da literatura mundial obtiveram por séculos adentro. Ou será mesmo verdade que cada época tem a literatura que merece? Eu, sinceramente, duvido.

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